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terça-feira, 29 de março de 2016

Baianos ciumentos querem ficar longe das estatísticas de cornos

A mulher é feminista, meu velho. Emprego fixo, centrada, independente, equilibrada. Nasceu e se criou na Pituba, Salvador, Bahia. Mas basta mexer com o namorado que ela vira na porra! Se uma fulana qualquer fica de conversinha fiada com o macho de Thalita*, 28 anos, em segundos ela roda três baianas e uma vendedora de mingau.
“Quem é essa piriguete?!”, exclamou essa semana ao seu boy, ao perceber que uma dita cuja estava de frete com o rapaz. É que, em Salvador, o ciúme é expressado de forma peculiar. Quando as baianas (e baianos) estão enciumados, geralmente as palavras têm a força de uma porrada segura no meio da cara. Dá vontade de rumaladesgraça na rival. Se plante, pai! 
Isso quando o termo “piriguete” não é substituído por “bozenga” ou até pelo nome popular das profissionais do sexo. “Quem é essa p...?”. Não há dados sobre ciúmes na capital baiana, mas há sobre traição. Segundo uma pesquisa realizada pelo próprio CORREIO em 2011, 42,8% dos moradores de Salvador admitem ter traído seu parceiro.
Mapa da infidelidade em Salvador (Foto: Reprodução)
No caso de Thalita, fica clara a vontade de não virar estatística. Por isso, faz igual a Ivete Sangalo em dezembro do ano passado. A diva do axé não contou conversa. De cima do palco, em pleno show, achou que seu marido estava lhe tirando. "Quem é essa aí, Papai? Tá cheia de assunto, hein? Vou passar a porra nela!", disse, na frente de todo mundo, ao ver o nutricionista Daniel Cady de lero com uma loira no camarote. A expressão “quem é essa aí, papai” virou até estampa de camisetas.
Com a bióloga Luana*, acontece o contrário. Seu marido é músico porretão de uma conhecida banda de reggae em Salvador. O assédio sobre o rapaz irrita a moça, que assiste tudo ao lado das fãs (só que não). Certa feita, dentro de uma casa de shows, pra não ter que meter a mão em uma, inventou que ela estava procurando confusão na frente do palco. Chamou a segurança do evento, que retirou a figura do recinto. “Eu, nascida e criada em mangue, vou perder para caranguejo?”, pergunta.
Fomos às ruas conversar com casais e soteropolitanos avulsos sobre suas formas de exercer e verbalizar o ciúme. A vendedora Carla Santos de Jesus, 27 anos, não perdoa. “Se for uma fulana que já tô cismada eu já chego rumando. Se eu pegar no meu plantão eu bagaço”, avisou. E ainda dá nome. “Simone, quando você me ver se esconda, viu mamãe! Vou chegar chegando! Não vai ter argumento”.
O jornalista Marcos*, 31, desconhece a namorada quando ela entra em crise de ciúmes. Basta ele defender uma amiga em uma discussão qualquer para ela, uma jovem e competente produtora de TV, virar no estopô. “Tá defendendo ela, é? Tá defendendo vagabunda agora?”, costuma dizer. Isso porque estamos falando de um namoro que existe há três anos, mas sequer é oficializado. Que viagem.   
A estudante de publicidade Lucy*, de 24 anos, espera pelo dia que vá precisar lascar uma em banda. Nunca aconteceu de flagrar um peguete de frete, mas o discurso já tá pronto. “Tá vendo que tem dona não, é? É cega? Ou tá querendo ser?”. Isso se ficar só na lábia. “Meu perfil é mais de chegar logo dando voadora. Oxe, é cada uma. Sou otária, é?”.
Os homens são menos incisivos nas palavras. A maioria é tudo corno manso e nem dá trela. Claro, tem uns abestalhados que partem logo pro crime e há casos de chamar pra mão. Esses dias, dois miserês se pegaram feio no bairro do Uruguai e viraram cena do programa Ronda, da TV Arat(ivis).
Quando foi ver, um tinha procurado historinha com a mulher do outro. Por isso, bom mesmo é quando o sacana é espirituoso. Na hora do flagrante, larga a puia na manha. “Colé de mermo, meu irmão. Você guenta um pau na boca?”. Aí fica tudo de boa. Se duvidar, daqui a pouco tão batendo baba juntos e as porra.
“Ciúme do baiano é mais provinciano”, diz psicanalista
O jeito baiano de sentir ciúme não chega a ser muito diferente dos demais lugares. É o que acredita a psicóloga e psicanalista Maria da Conceição Nobre. “O ciúme é do humano. Numa relação você quer tomar a pessoa como um objeto seu, uma cadeira. Não é um sujeito que tem vontade. O Lacan diz que há pessoas que tomam a outra pessoa como um pedaço de carne”.
Mas a forma de expressar esse ciúme tem certa diferença, sim. Neste aspecto, diz a psicanalista, o baiano é mais provinciano. “Tenho várias analisantes baianas que já deram uma de Ivete. Quer dizer, o cara não pode nem conversar com uma pessoa?”, pergunta Conceição. Ela compara com o jeito carioca de lidar com a situação.
“Acho o carioca mais despojado. Ele diz: ‘Você tá comendo minha mulher, meu irmão. Qual é a tua?’ Leva mais na malandragem, sabe? Mas também porque as pessoas são mais livres. A sociedade é mais liberada. Não tem essa coisa provinciana daqui. Aqui tem uma sociedade mais careta. Mas é a única diferença. Porque o ciúme em si é igual”, explica Conceição, uma carioca retada casada com um baiano da gema.  
55,6% dos moradores do Rio Vermelho já traíram  
O bairro mais boêmio de Salvador é também o que mais dá o zig. Segundo a Pesquisa realizada em 2011 pelo Instituto Futura, em parceira com o CORREIO, 55,6% dos moradores do Rio Vermelho afirmaram que já traíram. A Liberdade vem em segundo, com 49%, seguido de perto pelo Cabula (48,6%). Para os que querem fidelidade, melhor ir morar na Boca do Rio, onde 68% dos entrevistados disseram que nunca se aplicaram estando em um relacionamento sério.
Por outro lado, a Barra abriga o maior índice de cornos que admitem ter tomado chifre. Ali, 78,9% das pessoas afirmaram já terem sido traídas. Depois vem o Subúrbio (68,4%) e Cajazeiras (66,7%). Em Brotas, o pessoal costuma acreditar nos parceiros. Ao todo, 53,8% dos moradores disseram que nunca levaram “um perdido”. Haja confiança.
Ao serem questionados com a seguinte pergunta: “O(A) Sr.(a) já traiu?”, chama a atenção a questão da idade. No grupo de 20 a 29 anos, 49,2% disseram que não. O percentual chega a 60,5% no grupo de 40 a 49 anos e oscila para 57,7% na faixa de 50 a 59. Mas, entre as pessoas com mais de 60 anos, a negativa salta para 73,6. Na análise por gênero, 60,2% dos homens confessaram o adultério, contra 28,1% das mulheres. Por outro lado, 63,1% das pessoas ouvidas disseram que o “sexo frágil” disfarça melhor a traição.
Glossário
Virada na porra – Zangada, chateada
Fretando – Corruptela de “flertando”. Paquerando
Boy - Namorado
Dita cuja – Sujeita, a rival
Se plantar – Ficar na sua
Trocar ideia - Conversar
Rumaladesgraça – Bater, agredir
Meter a mão – Bater, agredir
Tirar de otário – Fazer de besta
Lero - Conversa
Não contar conversa – Não enrolar, ir direto ao assunto
Porretão – Especialista, bom no que faz
Virado no estopô – Zangado, chateado
Rumada – Golpe, soco
Litros – Em grande quantidade
Lábia – Conversa com malícia
Bagaçar – Espancar, machucar algém
Abestalhado - Idiota
Chamar pra mão – Chamar para a briga
Dar voadora – Golpear de forma espalhafatosa
Corno manso – Traído que não usa violência
Dar trela – Dar conversa
Miserê – Bom no que faz
Procurar historinha – Procurar conversa enviesada
Mermo - mesmo
Puia – Jogo de palavras com duplo sentido
De boa – Tá tudo certo
Baba – Pelada, jogo de futebol
Dar o zig – Driblar, trair
Se aplicar – Dar em cima

Correio da Bahia

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